ALTERAÇÃO DO PRENOME E DO GÊNERO DE PESSOA TRANSGÊNERO NO RCPN
1 Pode ser averbado a alteração do prenome e do gênero de pessoa transgênero no RCPN ?
R: Sim, conforme o Provimento 73 do CNJ, de 2018, em seu art. 1º, dispõe sobre a averbação da alteração do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento de pessoa transgênero no Registro Civil das Pessoas Naturais.
Nos termos do art. 2º do Prov. 73.2018 do CNJ, toda pessoa maior de 18 anos completos habilitada à prática de todos os atos da vida civil poderá requerer ao ofício do RCPN a alteração e a averbação do prenome e do gênero, a fim de adequá-los à identidade autopercebida, cuja alteração poderá abranger a inclusão ou a exclusão de agnomes indicativos de gênero ou de descendência. A alteração não compreende nomes de família e não pode ensejar a identidade de prenome com outro membro da família.
A alteração tem natureza sigilosa, razão pela qual a informação a seu respeito não pode constar das certidões dos assentos, salvo por solicitação da pessoa requerente ou por determinação judicial, hipóteses em que a certidão deverá dispor sobre todo o conteúdo registral, no caso, certidão de inteiro teor.
No mesmo sentido, o entendimento do STJ e do STF:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO DE NASCIMENTO PARA A TROCA DE PRENOME E DO SEXO (GÊNERO) MASCULINO PARA O FEMININO. PESSOA TRANSEXUAL. DESNECESSIDADE DE CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO. (…)7. A citada jurisprudência deve evoluir para alcançar também os transexuais não operados, conferindo-se, assim, a máxima efetividade ao princípio constitucional da promoção da dignidade da pessoa humana, cláusula geral de tutela dos direitos existenciais inerentes à personalidade, a qual, hodiernamente, é concebida como valor fundamental do ordenamento jurídico, o que implica o dever inarredável de respeito às diferenças. 8. Tal valor (e princípio normativo) supremo envolve um complexo de direitos e deveres fundamentais de todas as dimensões que protegem o indivíduo de qualquer tratamento degradante ou desumano, garantindo-lhe condições existenciais mínimas para uma vida digna e preservando-lhe a individualidade e a autonomia contra qualquer tipo de interferência estatal ou de terceiros (eficácias vertical e horizontal dos direitos fundamentais). (…) 12. Exegese contrária revela-se incoerente diante da consagração jurisprudencial do direito de retificação do sexo registral conferido aos transexuais operados, que, nada obstante, continuam vinculados ao sexo biológico/cromossômico repudiado. Ou seja, independentemente da realidade biológica, o registro civil deve retratar a identidade de gênero psicossocial da pessoa transexual, de quem não se pode exigir a cirurgia de transgenitalização para o gozo de um direito. 13. Recurso especial provido a fim de julgar integralmente procedente a pretensão deduzida na inicial, autorizando a retificação do registro civil da autora, no qual deve ser averbado, além do prenome indicado, o sexo/gênero feminino, assinalada a existência de determinação judicial, sem menção à razão ou ao conteúdo das alterações procedidas, resguardando-se a publicidade dos registros e a intimidade da autora. (STJ – REsp: 1626739 RS 2016/0245586-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 09/05/2017, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/08/2017).
STF – Decisão: O Tribunal, por maioria, vencidos, em parte, os Ministros Marco Aurélio e, em menor extensão, os Ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, julgou procedente a ação para dar interpretação conforme a Constituição e o Pacto de São José da Costa Rica ao art. 58 da Lei 6.015/73, de modo a reconhecer aos transgêneros que assim o desejarem, independentemente da cirurgia de transgenitalização, ou da realização de tratamentos hormonais ou patologizantes, o direito à substituição de prenome e sexo diretamente no registro civil. Impedido o Ministro Dias Toffoli. (STF – ADI 4275, Redator para o acórdão o Ministro Edson Fachin. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 1º.3.2018.
2 Quais são os requisitos obrigatórios para o sucesso da averbação da alteração do prenome e do gênero de pessoa transgênero?
R: Conforme o Prov. 73 do CNJ, em seu art. 3º e parágrafos, a averbação do prenome, do gênero ou de ambos poderá ser realizada diretamente no ofício do RCPN onde o assento foi lavrado. E no seu parágrafo único atesta que o pedido poderá ser formulado em ofício do RCPN diverso do que lavrou o assento; nesse caso, deverá o registrador encaminhar o procedimento ao oficial competente, às expensas da pessoa requerente, para a averbação pela Central de Informações do Registro Civil (CRC).
O procedimento será realizado com base na autonomia da pessoa requerente, que deverá declarar, perante o registrador do RCPN, a vontade de proceder à adequação da identidade mediante a averbação do prenome, do gênero ou de ambos. O atendimento do pedido apresentado ao registrador independe de prévia autorização judicial ou da comprovação de realização de cirurgia de redesignação sexual e/ou de tratamento hormonal ou patologizante, assim como de apresentação de laudo médico ou psicológico. O registrador deverá identificar a pessoa requerente mediante coleta, em termo próprio, mediante sua qualificação e assinatura, além de conferir os documentos pessoais originais.
O requerimento será assinado pela pessoa requerente na presença do registrador do RCPN, indicando a alteração pretendida. A pessoa requerente deverá declarar a inexistência de processo judicial que tenha por objeto a alteração pretendida. A opção pela via administrativa na hipótese de tramitação anterior de processo judicial cujo objeto tenha sido a alteração pretendida será condicionada à comprovação de arquivamento do feito judicial.
A pessoa requerente deverá apresentar ao ofício do RCPN, no ato do requerimento, os seguintes documentos:
I – certidão de nascimento atualizada;
II – certidão de casamento atualizada, se for o caso;
III – cópia do registro geral de identidade (RG);
IV – cópia da identificação civil nacional (ICN), se for o caso;
V – cópia do passaporte brasileiro, se for o caso;
VI – cópia do cadastro de pessoa física (CPF) no Ministério da Fazenda;
VII – cópia do título de eleitor;
IX – cópia de carteira de identidade social, se for o caso;
X – comprovante de endereço;
XI – certidão do distribuidor cível do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);
XII – certidão do distribuidor criminal do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);
XIII – certidão de execução criminal do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);
XIV – certidão dos tabelionatos de protestos do local de residência dos últimos cinco anos;
XV – certidão da Justiça Eleitoral do local de residência dos últimos cinco anos;
XVI – certidão da Justiça do Trabalho do local de residência dos últimos cinco anos; –
XVII – certidão da Justiça Militar, se for o caso.
A falta de documento listado impede a alteração indicada no requerimento apresentado ao ofício do RCPN, porém as ações em andamento ou débitos pendentes, nas hipóteses dos incisos XI, XII, XIII, XIV, XV, XVI e XVII do § 6º, não impedem a averbação da alteração pretendida, que deverá ser comunicada aos juízos e órgãos competentes pelo ofício do RCPN onde o requerimento foi formalizado.
3 Quais são os requisitos facultativos da citada averbação no RCPN?
R: Pelo art. 4º, § 7º, do Prov. 73 do CNJ, além dos documentos listados no parágrafo anterior, é facultado à pessoa requerente juntar ao requerimento, para instrução do procedimento previsto no presente provimento os seguintes documentos:
I – laudo médico que ateste a transexualidade/travestilidade;
II – parecer psicológico que ateste a transexualidade/travestilidade;
III – laudo médico que ateste a realização de cirurgia de redesignação de sexo.
Todos os documentos referidos no art. 4º do Provimento 73 do CNJ deverão permanecer arquivados indefinidamente, de forma física ou eletrônica, tanto no ofício do RCPN em que foi lavrado originalmente o registro civil quanto naquele em que foi lavrada a alteração, se diverso do ofício do assento original.
4 Quais órgãos ou instituições deverão receber a comunicação da averbação da alteração do prenome e do gênero?
R: O procedimento de alteração no assento, o ofício do RCPN no qual se processou a alteração, às expensas da pessoa requerente, comunicará o ato oficialmente aos órgãos expedidores do RG, ICN, CPF e passaporte, bem como ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) (CNJ, Prov. 73.2018, art. 8º) . A pessoa requerente deverá providenciar a alteração nos demais registros que digam respeito, direta ou indiretamente, a sua identificação e nos documentos pessoais.
A subsequente averbação da alteração do prenome e do gênero no registro de nascimento dos descendentes da pessoa requerente dependerá da anuência deles quando relativamente capazes ou maiores, bem como da de ambos os pais.
A subsequente averbação da alteração do prenome e do gênero no registro de casamento dependerá da anuência do cônjuge. Havendo discordância dos pais ou do cônjuge quanto à averbação mencionada, o consentimento deverá ser suprido judicialmente.
5 A citada averbação no RCPN poderá ser desconstituída?
R: Sim, uma vez que a alteração no RCPN poderá ser desconstituída na via administrativa, mediante autorização do juiz corregedor permanente, ou na via judicial.